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segunda-feira, 24 de agosto de 2015




... O Sertão está em toda parte. (GSV)


Uma vereda

Buritis
 
O sertão é do tamanho do mundo. (GSV)




"- Um homem não é mais forte do que um boi... E nem todos os bois obedecem sempre ao homem..."
Conversa de Bois conto do livro Sagarana.

Esbarramos num varjeado, esconso lugar, por entre o daGarapa e o da-Jibóia, ali tem três lagoas numa, com quatro cores: se diz que a água é venenosa. (GSV)

Cachoeira do Ribeirão Jiboia

A gente tem de sair do sertão! Mas s ó   se sai do sertão é tomando  conta  dele   a  dentro... (GSV)
 


Como aquele trecho da estrada fosse largo e nivelado, todos iam descuidosos, em sóbria satisfação: Agenor Soronho chupando o cigarro de palha; o carro com petulância, arengando; a poeira dançando no ar, entre as patas dos bois, entre as rodas do carro e em volta da altura e da feiúra do Soronho; e os oito bovinos, sempre abanando as caudas para espantar a mosquitada, cabeceantes, remoendo e tresmoendo o capim comido de-manhã.

Só Tiãozinho era quem ta triste. Puxando a vanguarda, fungando o fio duplo que lhe escorria das narinas, e dando a direção e tenteando os bois.

Conversa de bois – Sagarana.



Com a campina roxa brandamente, vagarosa por onde fomos, tocamos, querendo o poente e tateando tudo, chapada sem lugar de fim. (GSV)



Conciso já principiava a chuviscar, e eu estava pensando: que, por ali, menos longe, algum rancho ou alguma casa de sitiante havia de vagar. (GSV)


Seriam bem dez horas, e, de repente, começou a chegar - nhein... nheinhein... renheinhein... - do caminho da esquerda, a cantiga de um carro-de-bois. - Conversa de bois.














quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Um passeio por Cordisburgo

Painéis para xilografia usados nos livros de João Guimarães Rosa.
 
 
Uma das coisas mais belas que vejo na humanidade, é o gosto em  homenagear os berços de seus grandes escritores e personagens das grandes estórias da literatura universal.
Dublin é quase sinônimo  de Leopold Bloom e de seu criador, James Joyce.
Roken na Alemanha cultua a memória de Nietzsche;
Buenos Aires respira e vive Jorge Luis Borges;
Frankfurt cultua a “Goethe House” em homenagem ao escritor de Fausto.
Aracataca na Colômbia cultua seu mais ilustre nativo, Gabriel Garcia Marques.
É bom notar que nem sempre  é nas capitais ou nos grandes centros  que estão os berços dos gênios, que por meio de palavras, tornam o mundo um lugar mais belo.
No Brasil temos Cordisburgo, uma cidadezinha bucólica do interior de Minas Gerais, onde se pode almoçar em um restaurante chamado Sarapalha e se pode dormir em um hotel chamado Nonada. Uma cidade onde os moradores se orgulham de ser conterrâneos de “um chamado João”.
 

Neste post, estão alguns momentos do pitoresco “burgo” , não um qualquer,  mas um burgo do coração, “um Cordisburgo”.


 

 


Vista Parcial da cidade de Cordisburgo.

O sertão está em toda a parte.

Não importa os caminhos que trilhamos, as distâncias que vencemos, o sertão como disse João Guimarães Rosa esta dentro da gente. “Sabe o senhor: sertão é onde o pensamento da gente se forma mais forte do que  o poder do lugar. Viver é muito perigoso...”

Trecho próximo a Andrequicé -MG

Araras  - Foto. R. Camargos
 
 

A velha máquina de escrever usada por João Guimarães Rosa, hoje exposta no museu em Cordisburgo. Foto. R. Camargos


Maquete do memorial à João Guimarães Rosa. Foto. R. Camargos


Interior da antiga casa da família de João Guimarães Rosa, hoje um museu em sua homenagem em Cordisburgo. foto: R. Camargos


Fachada da casa de seu Florduardo do Pinto Rosa, pai de João Guimarães Rosa. Foto: R. Camargos

Cozinha do morador do sertão, na Casa do Manuelzão
 em Andrequicé – Três – Marias/MG. Foto: R. Camargos
 

A singela Fachada do museu Manuelzão,
personagem das estórias e da história de João Guimarães Rosa. Foto: R. Camargos
 
 
Comitiva em que participou João Guimarães Rosa e que o inspirou muitas estórias.


Foto de Manuelzão na época em que inspirou personagens de João Guimarães Rosa.

Foto do Acervo do Museu do Manuelzão em Andrequicé-MG. 

João Guimarães Rosa - Acervo do Museu Manuelzão.




Visite o roteiro turístico João Guimarães Rosa, uma viagem no tempo e nas páginas do grande domador de palavras.


 
 

sábado, 1 de agosto de 2015

 

A fauna na obra de João Guimarães Rosa


Por influência do João:
 Um assomado de coisa que eu tenho por dívida com a lição da leitura, é o descobrimento de uma imensidão de bicho e planta ao derredor de onde vivo... o cerrado.

Mire e veja... sem aquela escrivinhação toda daquele doutor, eu podia hoje tá vivendo nesses ermos do Brasil Central sem ter sabença  de nome  e cor,  tipo de avuar e correr pelos matos desses bichinhozinhos que enfeitam esses campos de Deus.
Com muita humildade, sem abraçar um tiquinho de nada o tanto de bicho que o João descreveu e desenhou nos miolo da imaginação da gente, nas linhas que seguem, apresento um pouquinho dos bichos usando o palavrear escrito e dito no livro dele.

Pode ser que tenha um erro aqui outro acolá, pois sou meio lerdo no aprendimento das coisas, mas a intenção é homenagear o João.

Palavreado e retrato
 
Mas, melhor de todos conforme o Reinaldo disse-o que é o passarim mais bonito e engraçadinho de rio- abaixo e rio -acima: o que se chama o manuelzinho-da-croa.
 
Manuelzinho-da-croa- Batuíra de coleira - fonte:Worldbirds.com
 

– “É aquele lá: lindo!” Era o manuelzinho-da-croa, sempre em casal, indo por cima  da  areia  lisa, eles altas perninhas vermelhas, esteiadas  muito atrás traseiras,                                                                      desempinadinhos,   peitudos, escrupulosos catando suas coisinhas para comer alimentação. Machozinho e fêmea às vezes davam beijos de biquinquim a galinholagem deles. “É preciso olhar para esses com um todo carinho...” – o Reinaldo disse. P. 122 - 1986


Saiba o senhor, o de-janeiro é de águas claras. E é rio cheio de bichos cágados. Se olhava a lado, se via um vivente desses em cima de pedra, quentando sol, ou nadando descoberto, exato. Foi o menino quem me mostrou. P.87 - 1986

Cágado - Foto: R. Camargos

Cágado - Foto: R. Camargos
 
E tinha o Xenxém, que tintipiava de manhã no revoredo, o  saci-do-brejo, a doidinha, a gangorrinha, o tempo-quente, a rola-vaqueira... e o bem-te-vi que dizia, e as araras enrouquecidas.
Povi - foto: R. Camargos
 
Xenxém ou marreca caneleira - Foto: R. Camargos



Xenxém ou marreca caneleira - Foto: R. Camargos


Araras em pequizeiro - Foto: R. Camargos




... Assovios que fechavam o dia: o papa-banana, o azulejo, a garricha-do-brejo, o suiriri, o sabiá-ponga, o grunhatá-do-coqueiro. GSV-p.19-20 -1986
Suriri - fonte: Worldbirds.


 
 
 
Azulejo fazendo o ninho. foto: R. Camargos

 
Sabiá-ponga - Foto: R. Camargos

 

 “Escutei um barulho. Tocha de carnaúba estava alumiando. Não tinha ninguém restado. vi um papagaio manso falante, que esbagaçava com o bico algum trem.” P. 81 -1986
Papagaio domesticado. Foto: R. Camargos
 

Os quem-quem, aos casais, corriam,  catavam,  per meio   às  reses,  no  liso  do  campo  claro. Mas, nas árvores,  pica-pau bate e grita. E escutei o barulho,  vindo  do  dentro  do  mato, de um macuco sempre solerte. Era mês  de macuco ainda passear solitário macho e fêmea desemparelhados, cada um por si. E o macuco vinha andando, sarandando, macucando:  aquilo  ele ciscava  no  chão, feito galinha de casa. Eu ri – “Vigia este, Diadorim!” – eu disse; pensei que Diadorim  estivesse  em  voz  de  alcance.  Ele não estava. P. 253 - 1986

Quem-quem ou Quero-quero solitário. Fonte: R.Camargos


Quem-quem em bando.

Quem-quem ou Quero-quero solitário. Fonte: R.Camargos
 
Pica-pau - Foto R. Camargos
Macuco - Fonte: Wikipedia
 

Irara – ou Papa-mel.
Irara - fonte: Informativo do Vale
 
Irara ou Papa-mel - fonte: Procarnivoros.com

 
 

"se aquele bicho irara tinha jazido lá, então ali não tinha cobra. Tomei o lugar dele." p. 13 - 1986

 

Lontra.

“Perto de muita água, tudo é feliz. Se escutou, banda do rio, uma lontra por outra: o issilvo de plim, chupante.” P. 21 – 1986.

 
Lontra. fonte: funzel.org

 

Ariranha:
Ariranha: Fonte - Wikipédia.
 
 

- o rio é cheio de baques, modos moles, de esfrio, e uns sussurros de desamparo.  Apertei os dedos no pau da canoa. Não me lembrei do Caboclo-d’Água, não me lembrei do perigo que é a “onça- d’água”, se diz a ariranha essas desmergulham, em bando, e becam a gente: rodeando e então fazendo a canoa virar, de estudo. P. 88 - 1986

Sucuriú (sucuri)

Por lá, sucuri geme. Cada surucuiú do grosso: voa corpo no veado e se enrosca nele, abofa trinta palmos! Tudo em volta, é um barro colador, que segura até casco de mula, arranca ferradura por ferradura. Com medo de mãe-cobra, se vê muito bicho retardar ponderado, paz de hora de poder água beber, esses escondidos atrás  das  touceiras  de  buritirana. P 22-1986

Sucuri - Fonte: Instituto Butatã



"Sucuriú agride de açoite, feito o relâmpago, pula inteira no outro bicho...Aquilo é um abalo! Um vê: ela já ferrou dente e enrolou no outro o laço de suas voltas, as duas ou três roscas, zasco-tasco, no soforçoso...O bicho nem grita, mal careteia, debate as pernas de trás, o aperto tirou dele o ar dos bofes. Sucuriú sabe o prazo, que é só para sufocar, tifetrije...Aí, solta as laçadas de em redor do bicho morto, que ela tateia todo, com a linguazinha. Começa a engolir..." Tutaméia - Como Ataca a Sucuri - p.32-33 -1967 


 
Ah, e cobra? Pensar que, num corisco de momento, se pode  premer  mão numa rodilha  grossa de cascavel, numa certa morte dessas. P. 178 - 1986

 
Dois momentos de uma cascavel. Fotos: R. Camargos 


Acontecendo tudo com risadas e ditos amigos como quando com seu arreleque por-escuro uma nhaúma devoou, ou quando eu pulei para apanhar um raminho de flores e quase caí comprido no chão, ou quando ouvimos um him de mula, que perto pastava. P.124 – 1986




 
Voo da Nhaúma em muitos lugares chamada de Inhumas. Foto: R. Camargos
Fonte: Panoramio.com

Nhaúma - Foto R. Camargos




 

As garças, elas em asas. O rio desmazelado, livre rolador. E aí esbarramos parada, para demora, num campo solteiro, em varjaria descoberta, pasto de muito gado. P.250 - 1986

Garça Branca - foto R. Camargos
 

coruja

Na noite Bebelo saiu, engatinhando por mais escuro, e revestido com as roupas bem pretas que arranjou, dum e doutro. Ele devia de ter ido até longe, como rato em beira de paiol – que coruja come. Queria era farejar com os olhos o reprofundo. P. 306- 1986

Coruja barranqueira - Foto R. Camargos

 
Corujas - Foto R. Camargos
 

Seriema e outros bichos

“Mas levei minha sina. Mundo, o em que se estava, não era para gente: era um espaço para os de meia-razão.  Para ouvir gavião guinchar ou as tantas seriemas que chungavam, e avistar as grandes emas e os veados correndo, entrando e saindo até dos velhos currais de ajuntar gado, em rancharias sem morador? Isso, quando o ermo melhorava de ser ermo.”  GSV- P.275 – 1986
 
Seriema Foto: R. Camargos

 






 
Seriema: Fotos de Mirian Cássia


Seriema: Fotos de Mirian Cássia


Emas, substituíram os campos pelas lavouras. Foto: R. Camargos


 

 
 
A chapada é para aqueles casais de antas, que toram trilhas largas no cerradão                                                                                                                                                                     por aonde, e sem saber de ninguém assopram sua bruta força. Aqui e aqui, os tucanos senhoreantes, enchendo as árvores, de mim a um tiro de pistola – isto resumo mal. Ou o zabelê choco, chamando seus pintos, para esgaravatar terra e com eles os bichinhos comíveis catar. 275.
Tucano. Foto: R. Camargos
Tucano. Foto: R. Camargos


Anta: Instituto ecoação


 



As garças é que praziam de gritar, o garcejo delas, e o socó-boi range cincerros, e o socó latindo sucinto. Aí pelo mato das pindaíbas avante, tudo era um sapal. Coquexavam. De tão bobas  tristezas, a gente se ria, no friinho de entrechuvas. P. 257 - 1986
 


O socó-Boi. Foto: R. Camargos

O socó-Boi. Foto: R. Camargos