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quarta-feira, 19 de julho de 2017

FOTOS DO IV CAMINHO DO SERTÃO

Musica:Siba e a Fuloresta: Toda vez que eu dou um passo o mundo sai do lugar
E o Vento me levou - Tribo do Sol.

O Caminho do Sertão é mais que uma caminhada sócio-eco-literária, é uma experiência  única.
Foram mais de 180 Km percorridos entre os dias 09 e 16 de julho, cerca de 100 pessoas entre caminhantes e apoio dividiram trilhas, caminhos e veredas. Eu era um deles.

Chegamos em Sagarana distrito de Arinos no dia 08 de julho, nesse dia fomos apresentados ao caminho. Cerimônias belas e candentes, conduzidas por pessoas apaixonadas pela obra de João Guimarães Rosa, pelas questões sociais dos moradores do sertão e pela natureza. O contágio é imediato.

 

Somos apresentados aos “uaicais” ou os Haicais do sertão, que assim como os versos japoneses nos chamam a esse momento de imersão na natureza do sertão.

E somos também chamados a praticar o UAI (Unidade de Atenção ao Instante), ao fim da viagem percebi, que minha caminhada foi formada por milhares de instantes que carregarei comigo.

Logo na chegada tive a grata surpresa de conhecer o escritor alemão Willi Bolle, que escreveu o magnífico “grandesertão.br” que analisa de forma muito rica duas grandes obras da literatura brasileira, o Grande Sertão: Veredas e os Sertões.

Com o Professor Willi Bolle

Outra bela surpresa foi caminhar e compartilhar as trilhas e caminhos com  Juliana, uma jovem sobrinha de João Guimarães Rosa, que na ocasião fazia um documentário sobre o caninho.

O primeiro trecho da caminhada foi de aproximados 35 Km até a comunidade de Morrinhos. Um antigo povoado às margens do rio Urucuia, o “rio de amor” de Riobaldo. Ali assisti a uma bela apresentação de cantigas com violas, rabecas e outros instrumentos alguns fabricados ali mesmo na região.









Uma homenagem ao passeio de canoa dos meninos - Riobaldo e Diadorim.

o rio Urucuia, o rio de amor do Riobaldo.

Arruda, eu e Juliana -Sobrinha do João Guimarães Rosa.

O segundo dia fizemos uma breve caminhada por grandes lavouras e pegamos um ônibus para visitarmos o projeto de assentamento Caiçara, onde visitamos um pequeno produtor que produz vários tipos de mandioca, um exemplo de agricultura sustentável. Ali fizemos um lanche com produtos do assentamento, beiju, batata e mandioca e vários biscoitos.  Fomos para a vila de Bom Jesus onde almoçamos uma comida deliciosa e depois caminhamos por mais 15 Km até a fazenda Menino.




Foto: Jackson Santana - Um lanche com as comidas típicas do Sertão.






Fiquei surpreso em conhecer um antigo projeto de cidade ali naquela fazenda. Cidade Marina, uma cidade com projeto de Oscar Niemayer, que visava abrigar até 200 mil pessoas. A moradora da casa que nos recebeu, a Dona Geralda, é uma sobrevivente da tortura psicológica impingida pela ditadura militar que queria prender o dono da fazenda. Ela relata com minúcias suas agruras e nunca deixou de ser uma pessoa que encanta e inspira.






À exemplo de todos os dias, às quatro da manhã fomos acordados pela belíssima voz da Daiana e de seu parceiro de alvorada. Posso dizer que é uma maneira encantada de despertar. Canções mágicas que ficaram nos corações e mentes de todos os caminhantes.


Desarmamos as barracas e fomos procurar o café da manhã, a travessia de hoje é para a barra da Aldeia. 33 quilômetros de passos, fotos, momentos, risos, conversas e silêncios.
Cheguei cedo ao destino, os rios Aldeia e Areia se encontram próximo ao nosso acampamento, o banho de rio estava garantido, mas não antes de uma cerveja. À noite muita música, danças e fogueira.


Da barra da Aldeia seguimos no dia seguinte ao distrito de Serra das Araras, mais 33 Km de uma belíssima caminhada. Na qual passamos por uma área de reserva, caminhamos mais de 20 km margeando uma vereda imensa.


os portais que nos conduziam sertão adentro.




Mandalas do vento, desenhadas pela natureza.

 Chegamos ao distrito de Serra das Araras caminhando por uma trilha alagada, de fato uns 300 a 500 m dentro de uma vereda, um alívio para os pés e um prêmio para os olhos.

"Sei como voltar: as cores do meu outono
desenham caminhos". 
Yberê Líbera


Em Serra das Araras fomos recebidos com festa, houve apresentação musical e danças típicas. Acampamos no quintal do  Arruda, que percorreu o caminho conosco nos primeiros dias.



Festa na Serra das Araras.

"Eu sabia que estávamos entortando era para a Serra das Araras  –  revinhar aquelas corujeiras nos bravios de ali além, aonde tudo quanto era bandido em folga se escondia  – lá se podia azo de
combinar mais outros variáveis companheiros". Grande Sertão: veredas.

A antiga terra dos jagunços é agora lar de hospitaleiros sertanejos, que cultivam uma cultura de música e dança muito bonita.



Quatro horas da manhã do dia  13, a canção da alvorada nos acorda como um beijo de mãe.
O caminho nos levará até à comunidade de Buraquinhos, passando pelas comunidades de Morro do Fogo e Barro Vermelho,  são 35 Km de caminhada.


Barro Vermelho, Morro do Fogo...morro vermelho e amarelo, morro branco...morro de todas as cores, morro de amores por esse Ser Tão belo.

A exemplo de todos os dias, a organização faz uma explanação do trecho que percorreremos, Almir Paraca, organizador, poeta e filósofo do caminho, todos os dias faz belas reflexões sobre temas variados, e a cada dia somos apresentados a um novo “uaicai”  tudo é inspirador.


A caminhada já começa surpreendendo, nos primeiro minutos chegamos a um rio arenoso e límpido emoldurado por um cenário de buritis e morros de arenito ao fundo. Uma visão de paraíso.







Os caminhantes vão conhecendo um pouco da rotina dos moradores das comunidades que atravessamos. A fabricação da farinha, a colheita do feijão, as habitações simples algumas ainda de adobe e chão batido, as casas de farinha cobertas com folhas de buriti e pessoas receptivas e felizes.



Selas Urucuianas na comunidade de Morro do Fogo








A caminhada segue pelo terreno muito arenoso, ora caminhamos no leito de um rio seco, ora atravessamos um cerrado aberto, sempre com as imponentes serras de arenito compondo o cenário.



















Um improvável vendedor de "dim-dim" na descida da serra.



Chegamos ao local do acampamento na comunidade de Buraquinhos já com o sol se pondo, tomamos um revigorante banho de rio e, nós onívoros, - porque segundo nosso guia seu Argemiro, carnívoro é onça - jantamos uma deliciosa costela bovina.





Interessantes esculturas produzidas pela erosão do chão arenoso























O último dia de caminhada foi tão belo e emocionante como só pode ser o caminho do sertão.
Caminhamos pelo Vão dos Buracos onde atravessamos 14 vezes o Rio Pardo, imensos paredões de rocha vermelha, amarela e branca e fomos almoçar na casa do nosso amigo Paulo que também era caminhante e grande conhecedor daquela região. Quando saímos para a última arrancada, já estava tarde. Subimos um caminho estreito escavado nas escarpas que chegam ao alto do chapadão onde está a cidade de Chapada Gaúcha.


A subida foi emocionante, no topo pudemos ver os últimos raios de sol daquele dia, um belíssimo espetáculo. Já estava escuro quando chegamos ao topo, de lá  podíamos ver as lanternas dos últimos caminhantes do sertão


Em Chapada Gaúcha fomos recebidos na festa dos povos, emocionante a recepção e as congratulações entre nós caminhantes eram capazes de comover.










Vista do Vão dos Buracos à partir do Mirante



Algumas das 14 travessias do Rio  Pardo













Há um mapa dos meus passos nos pedaços que eu deixei.




A geodésica na Fazenda Menino













"Digo  ao  senhor:  naquele  dia  eu  tardava,  no  meio  de sozinha travessia".-GSV