FOTOS DO IV CAMINHO DO SERTÃO
Musica:Siba e a Fuloresta: Toda vez que eu dou um passo o mundo sai do lugar
E o Vento me levou - Tribo do Sol.
O Caminho do Sertão é mais que
uma caminhada sócio-eco-literária, é uma experiência única.
Foram mais de 180 Km percorridos
entre os dias 09 e 16 de julho, cerca de 100 pessoas entre caminhantes e apoio
dividiram trilhas, caminhos e veredas. Eu era um deles.
Chegamos em Sagarana distrito de
Arinos no dia 08 de julho, nesse dia fomos apresentados ao caminho. Cerimônias
belas e candentes, conduzidas por pessoas apaixonadas pela obra de João
Guimarães Rosa, pelas questões sociais dos moradores do sertão e pela natureza.
O contágio é imediato.
Somos apresentados aos “uaicais”
ou os Haicais do sertão, que assim como os versos japoneses nos chamam a esse
momento de imersão na natureza do sertão.
E somos também chamados a
praticar o UAI (Unidade de Atenção ao Instante), ao fim da viagem percebi, que
minha caminhada foi formada por milhares de instantes que carregarei comigo.
Logo na chegada tive a grata
surpresa de conhecer o escritor alemão Willi Bolle, que escreveu o magnífico “grandesertão.br”
que analisa de forma muito rica duas grandes obras da literatura brasileira, o
Grande Sertão: Veredas e os Sertões.
Com o Professor Willi Bolle |
Outra bela surpresa foi caminhar
e compartilhar as trilhas e caminhos com Juliana, uma jovem sobrinha de João Guimarães
Rosa, que na ocasião fazia um documentário sobre o caninho.
O primeiro trecho da caminhada
foi de aproximados 35 Km até a comunidade de Morrinhos. Um antigo povoado às
margens do rio Urucuia, o “rio de amor” de Riobaldo. Ali assisti a uma bela
apresentação de cantigas com violas, rabecas e outros instrumentos alguns
fabricados ali mesmo na região.
o rio Urucuia, o rio de amor do Riobaldo. |
Arruda, eu e Juliana -Sobrinha do João Guimarães Rosa. |
O segundo dia fizemos uma breve
caminhada por grandes lavouras e pegamos um ônibus para visitarmos o projeto de
assentamento Caiçara, onde visitamos um pequeno produtor que produz vários
tipos de mandioca, um exemplo de agricultura sustentável. Ali fizemos um lanche
com produtos do assentamento, beiju, batata e mandioca e vários biscoitos. Fomos para a vila de Bom Jesus onde almoçamos
uma comida deliciosa e depois caminhamos por mais 15 Km até a fazenda Menino.
Foto: Jackson Santana - Um lanche com as comidas típicas do Sertão. |
Fiquei surpreso em conhecer um
antigo projeto de cidade ali naquela fazenda. Cidade Marina, uma cidade com
projeto de Oscar Niemayer, que visava abrigar até 200 mil pessoas. A moradora
da casa que nos recebeu, a Dona Geralda, é uma sobrevivente da tortura
psicológica impingida pela ditadura militar que queria prender o dono da
fazenda. Ela relata com minúcias suas agruras e nunca deixou de ser uma pessoa
que encanta e inspira.
À exemplo de todos os dias, às
quatro da manhã fomos acordados pela belíssima voz da Daiana e de seu parceiro
de alvorada. Posso dizer que é uma maneira encantada de despertar. Canções
mágicas que ficaram nos corações e mentes de todos os caminhantes.
Desarmamos as barracas e fomos
procurar o café da manhã, a travessia de hoje é para a barra da Aldeia. 33
quilômetros de passos, fotos, momentos, risos, conversas e silêncios.
Cheguei cedo ao destino, os rios
Aldeia e Areia se encontram próximo ao nosso acampamento, o banho de rio estava
garantido, mas não antes de uma cerveja. À noite muita música, danças e
fogueira.
Da barra da Aldeia seguimos no
dia seguinte ao distrito de Serra das Araras, mais 33 Km de uma belíssima
caminhada. Na qual passamos por uma área de reserva, caminhamos mais de 20 km
margeando uma vereda imensa.
os portais que nos conduziam sertão adentro. |
Mandalas do vento, desenhadas pela natureza. |
Chegamos ao distrito de Serra das Araras
caminhando por uma trilha alagada, de fato uns 300 a 500 m dentro de uma vereda,
um alívio para os pés e um prêmio para os olhos.
"Sei como voltar: as cores do meu outono
|
Em Serra das Araras fomos
recebidos com festa, houve apresentação musical e danças típicas. Acampamos no
quintal do Arruda, que percorreu o
caminho conosco nos primeiros dias.
Festa na Serra das Araras. |
"Eu sabia que estávamos entortando era para a Serra das Araras – revinhar aquelas corujeiras nos bravios de ali além, aonde tudo quanto era bandido em folga se escondia – lá se podia azo de
combinar mais outros variáveis companheiros". Grande Sertão: veredas.
A antiga terra dos jagunços é agora lar de hospitaleiros sertanejos, que cultivam uma cultura de música e dança muito bonita.
Quatro horas da manhã do dia 13, a canção da alvorada nos acorda como um
beijo de mãe.
O caminho nos levará até à
comunidade de Buraquinhos, passando pelas comunidades de Morro do Fogo e Barro
Vermelho, são 35 Km de caminhada.
Barro Vermelho, Morro do Fogo...morro vermelho e amarelo, morro branco...morro de todas as cores, morro de amores por esse Ser Tão belo. |
A exemplo de todos os dias, a
organização faz uma explanação do trecho que percorreremos, Almir Paraca,
organizador, poeta e filósofo do caminho, todos os dias faz belas reflexões
sobre temas variados, e a cada dia somos apresentados a um novo “uaicai” tudo é inspirador.
A caminhada já começa
surpreendendo, nos primeiro minutos chegamos a um rio arenoso e límpido emoldurado
por um cenário de buritis e morros de arenito ao fundo. Uma visão de paraíso.
Os caminhantes vão conhecendo um
pouco da rotina dos moradores das comunidades que atravessamos. A fabricação da
farinha, a colheita do feijão, as habitações simples algumas ainda de adobe e
chão batido, as casas de farinha cobertas com folhas de buriti e pessoas
receptivas e felizes.
Selas Urucuianas na comunidade de Morro do Fogo |
A caminhada segue pelo terreno
muito arenoso, ora caminhamos no leito de um rio seco, ora atravessamos um
cerrado aberto, sempre com as imponentes serras de arenito compondo o cenário.
Chegamos ao local do acampamento
na comunidade de Buraquinhos já com o sol se pondo, tomamos um revigorante
banho de rio e, nós onívoros, - porque segundo nosso guia seu Argemiro,
carnívoro é onça - jantamos uma deliciosa costela bovina.
Interessantes esculturas produzidas pela erosão do chão arenoso |
O último dia de caminhada foi tão
belo e emocionante como só pode ser o caminho do sertão.
Caminhamos pelo Vão dos Buracos
onde atravessamos 14 vezes o Rio Pardo, imensos paredões de rocha vermelha,
amarela e branca e fomos almoçar na casa do nosso amigo Paulo que também era
caminhante e grande conhecedor daquela região. Quando saímos para a última
arrancada, já estava tarde. Subimos um caminho estreito escavado nas escarpas que
chegam ao alto do chapadão onde está a cidade de Chapada Gaúcha.
A subida foi emocionante, no topo
pudemos ver os últimos raios de sol daquele dia, um belíssimo espetáculo. Já
estava escuro quando chegamos ao topo, de lá podíamos ver as lanternas dos últimos
caminhantes do sertão
Em Chapada Gaúcha fomos recebidos
na festa dos povos, emocionante a recepção e as congratulações entre nós
caminhantes eram capazes de comover.
Vista do Vão dos Buracos à partir do Mirante |
Algumas das 14 travessias do Rio Pardo |
Há um mapa dos meus passos nos pedaços que eu deixei. |
A geodésica na Fazenda Menino |
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